Empreendedores de sucesso, ontem na Univ. Nova de Lisboa - Design, Inspiration & Rock 'n' Roll

22/03/12

Empreendedores de sucesso, ontem na Univ. Nova de Lisboa

22/03/12

Isto de gerir uma empresa quando se nasceu como criativo é um tema que a mim me toca em particular pela adaptação em que ainda me encontro, quer em termos de gestão financeira, quer em gestão criativa, sobretudo porque o tempo que a primeira consome é enorme e porque o que a segunda precisa é fundamental.

Ontem dei um pulo à Faculdade de Economia da Nova, em Lisboa, para assistir à “Agenda Speedmeeting - Empreendedores” na qual estiveram presentes dois painéis de - adivinhem lá - empreendedores, pois claro, para apresentar os seus projectos e falar um pouco das aventuras tidas em torno deles.

Como nestas coisas é apanágio haver individualidades especiais convidadas, marcaram comparência também o Sr. Vitor Nunes do banco Banif e o Sr. Secretário de Estado do Empreendedorismo Carlos Nuno Oliveira. Se o primeiro serviu para debitar uma série de números e rácios a justificar porque o sistema bancário, coitadito, não pode emprestar dinheiro às empresas mas que é óptimo sermos empreendedores (sem pilim emprestado, claro) o segundo, perdoem-me mas para evitar chamar para aqui outros nomes, resta-me apenas dizer que chegou 40min atrasado, mandou uns bitaites de politiquice bacoca onde, diz ele, apresentou umas quantas medidas que o Governo está a criar para apoiar o empreendedorismo (esquecendo-se que não explicou absolutamente nada em concreto) e logo após dicertar pôs-se na alheta, naquilo a que chamo um total desrespeito pelas pessoas presentes, mas sobretudo, pelo painel de empreendedores que foram ali partilhar a sua experiência. É o fingimento habitual de quem sai do Olimpo para vir fingir que vive no mundo real - é que é bonito dizer que toda a gente deve ser empreendedor e criar o seu negócio mas depois continua-se a sufucá-lo com um nível altíssimo de impostos e completo desinvestimento na Economia real, não falando ainda de “obrigar” os senhores dos bancos a emprestar algum do dinheiro que os contribuintes tão bem lhes confiaram tão recentemente. Pá, eu sei que é complicado depois de ter o pilim na mão voltar a devolvê-lo, mas vá lá, façam lá o esforço ;)

Mas vamos ao que interessa - as experiências de empreendedorismo ali trazidas pelo João Miguel Tavares da Timeout, do Bruno Rosa do Janela Urbana, do Pedro Eleutério d’Os Burgueses e do João Mendes da Go Car Tours, no primeiro painel, e pela Joana Moura da Cooking Lab, João Tiago Carapau da Go to Market, Bernardo Motta da ObservIT, Paulo Canas da Surf.Art e André Marquet da Beta-I, no segundo painel, ao qual, infelizmente por compromissos, já não pude presenciar.

O João Miguel Tavares, que estranhamente até nem gaguejou tanto como eu esperava, de o ouvir no Governo Sombra, explicou o percurso da revista Timeout, desde o seu nascimento (quando estava refastelado no assento que tinha no seu antigo jornal e o seu colega o convenceu a criar uma Timeout tuga) até ao presente, com a diversidade e fiabilidade que a publicação agora oferece aos leitores. A Timeout, sendo uma revista de nicho e com um target bem definido voltado para as tendências e críticas urbanas, tornou-se uma publicação de referência mas que soube com isso lidar de forma elegante, mantendo a sua “personalidade” que o João descreveu, e que passa por esse tal equilíbrio entre o poder de uma crítica séria e o humor e jovialidade da sua edição.

Ponto marcante foi, sem dúvida, sentir-se logo a partir daqui um completo contraste com o lado mais burocrático das primeiras intervenções, algo que, com a clara mistura entre o “à vontade”, o humor e inteligência, torna o contacto despretensioso, e por isso mesmo cativante, pois significa estar ao mesmo nível que a sua plateia, ser alguém do mundo real, próximo dela.

O segundo empreendedor foi o Bruno Rosa, o criativo que muitos de nós conhecemos pelo seu portal, e que apresentou esse seu projecto que, inicialmente chamado Esfera, se viria, passados 3 anos, a chamar Janela Urbana, ganhando uma nova amplitude e vindo-se a tornar o projecto de vida que em troca de muito esforço o compensa com o seu crescimento pessoal e a felicidade que este “bébé” lhe proporciona. O Janela Urbana é para mim o portal online de referência sobre cultura urbana, moda e design, e a conquista desse estatuto vem com a estabilização, que o Bruno tão bem apontou, de uma audiência mais focada, pois também aqui a questão do nicho assume a sua relevância, é um facto, mas esse “agarrar” deve-se sobretudo à excelente estruturação editorial dos vários conteúdos, fugindo à lógica mais “libertina” de blog e aproximação à necessária “circunscrição” por bloco informativo - é, contudo, uma estruturação que permite ao utilizador que se revê apenas num tema chegar até ele de forma directa, e privilegiar simultaneamente uma leitura transversal dos vários conteúdos. É um projecto que levou o Bruno nessa evolução pessoal a abraçar a gestão criativa, editorial e financeira e que o tem levado ao encontro do enorme número de leitores que o seguem diariamente e que o “empurram” para novas formas de comunicação como o Anuário do Janela Urbana, ainda na forja, e que é uma excelente forma de comemorar os 10 anos do projecto.

Pedro Eleutério trouxe-nos, de forma mais exposta, a dicotomia “criativo” vs “gestor” e tornou-me um completo fã d’Os Burgueses e do conceito intervenção e criatividade que suporta o projecto. O Pedro apresentou em jeito de “timeline” do Facebook as várias etapas que este projecto foi tendo desde a sua nascença (ainda com poucos “likes”) até chegarem às grandes conquistas que no presente fazem dele e da sua parceira de projecto, Mia Lourenço, dois criativos/gestores de sucesso, até porque, “se o gestor não for criativo, não há grande coisa a fazer”. Os Burgueses foram criando, com muita “carolice”, o seu estatuto da forma mais simples do mundo - trabalhar, agir, procurar e não ter medo de ouvir um “não”, até porque ele está garantido à partida. O seu sucesso é a garantia de que a coragem perante a adversidade compensa e que, de facto, a teoria do Austin Kleon de que a “criação é subtracção” faz todo o sentido. Para minha tristeza, é também sinónimo de que, em Portugal, é sempre preciso teres sucesso lá fora para te reconhecerem posteriormente cá dentro - é errado, não faz qualquer sentido e já é altura de olharmos para tudo o que temos de bom cá dentro sem olhares mesquinhos ou com inferioridade na mona.

Seguiu-se o último orador do primeiro painel, o João Mendes, e, João, tirava-te o meu chapéu (se o tivesse) pelo “à vontade” (de quem estava a falar em casa, é certo) e pela coragem demostrada pelas sucessivas tiradas contra a indelicadeza demonstrada pelo Secretário de Estado e contra o que a banca nos anda a fazer, fazendo tirar do “senhor Banif” presente alguns sorrisos amarelos, lol. O João alargou a sua apresentação além da Go Car Tours, explicando que no seu percurso como empresário já havia falhado com duas anteriores tentativas de montar negócio e que, inclusive a Go Car Tours, teve ali um período trémulo, mas que acabariam por ser experiências positivas no sentido de lhe terem conferido o “calo” e o discernimento necessários para contornar adversidades - tanto que, daqui resulta um percurso que termina com ele na gestão internacional do franchising, ou seja, “os tugas a mandar bitaites”. Quando nasceu, não foram dadas à Go Car Tours grandes perspectivas de sucesso, mas o João apontou a “carolice” e o “amor” ao projecto (palavra usada pelo Pedro Eleutério para descrever a relação a’Os Burgueses) como as forças motrizes que impulsionaram a empresa à conquista dos prémios já obtidos e que, segundo ele, levarão a Go Car Tours a “fazer história e dentro de 5 anos vir a ser a melhor empresa de animação turística em Portugal”.

Foi uma daquelas noites em que vale a pena sair do atelier e levar uma injecção de coragem por esta gente que não aceita um, dois, cinquenta e cinco “nãos” como resposta, e sem dúvida, por experiências nas quais me revi completamente pela dualidade em que me vou também dividindo presentemente - o criativo que também tem de ser gestor e vice-versa - mas sobretudo, por malta que abraça com tal carinho o seu projecto ao ponto de lhe chamar amor, ao ponto de trabalhar nele 24 horas do seu dia e entregar-lhe a sua vida esperando ver em troca o seu filhote a crescer e a dar pinotes pelo mundo.
"Graphic design will save the world, right after rock and roll does."